quarta-feira, 7 de março de 2012

O Poder do MNO


Humildemente, nunca me achei a mais capacitada das pessoas pra conduzir ou participar de processos seletivos numa empresa. Apesar de ter uma formação mais administrativa que o normal para quem trabalha com TI e gostar de alguns processos de RH, eu nunca estudei esta área a fundo, fora do ambiente acadêmico. Porém, volta e meia, preciso estar numa posição decisória ou, pelo menos, envolvido em algumas atividades de staff que fazem parte do meu trabalho. Eu sempre gostei de participar de atividades além daquelas para as quais eu fui originalmente contratado. E com o tempo você acaba gostando de se envolver mais diretamente nesse tipo de atividade, especialmente as de seleção.

Quando se está numa posição de liderança, você acaba, inevitavelmente, participando de um ou outro processo desses. Ainda mais porque, se há posições a serem preenchidas no seu time, é natural que você queira conversar com os eventuais candidatos a essas vagas. Quando escrevi o post dos Nerds que gerenciam, mencionei que uma das atividades da liderança é justamente essa de gerir pessoas. E gerir pessoas não é apenas lidar com aquelas que já trabalham com você, mas também com as que poderão trabalhar com você. Aqui ainda tem mais um ponto que eu considero que se deve dar a devida relevância: é também importante que você saiba lidar com aqueles que deixaram de ser parte da sua equipe ou gerenciados por você. Manter contatos e bons relacionamentos pode ajudar tanto você quanto essas pessoas no futuro, com indicações de oportunidades ou mesmo de recontratação.

Voltando ao ponto, de vez em quando as simpáticas moças do RH (e alguém aqui já viu empresa de TI que tenha homens no RH? Alguém já viu homens no RH? Eu nunca vi!) vêm falar comigo sobre candidatos a vagas na empresa. Como esta trabalha com projetos variados, às vezes eu tenho de entrevistar candidatos que são da área, mas que não necessariamente serão alocados nos mesmos projetos que eu. Em outras palavras, você está auxiliando ainda mais o RH. Ah, a horizontalização! Essa é uma das partes divertidas disso! Confesso que, no começo de tudo, ainda em outra empresa, não foi fácil me colocar do outro lado da mesa. O frio na barriga nas primeiras entrevistas era tão intenso quanto no tempo em que eu era o candidato. Com o tempo você acostuma. E gosta. Histórias pra contar sempre existirão, pois vem gente de todo tipo tentar uma vaga na área. Alguns desses tipos são bem marcantes.

Mas, como eu disse no início, não sou nenhum expert em técnicas de RH. Porém, sem falsa modéstia, eu até acho que tenho certa capacidade de ver as pessoas. E, como cada um é diferente do outro, tento levar a entrevista de acordo com o candidato, explorando dele aquilo que acho que a empresa precisa, dentro das características que ele apresenta. Tento ver, além do que ele sabe, aquilo que ele é. Eu, pelo menos, me importo muito com isso. Se for o responsável por trazer alguém para a empresa, eu quero que este alguém, além de competente, tenha boa conduta, seja sociável, tenha características como liderança, proatividade, e todas aquelas outras características sobre personalidade e comportamento encontradas nas cartilhas de RH e que são sim, muito importantes. Só que eu não sigo um roteiro assim tão ortodoxo. Mesmo que o pessoal do RH me passe uma espécie de checklist, eu sempre acabo variando a entrevista e, às vezes, e de acordo com o candidato, tomo um caminho totalmente diferente. Tudo para tentar entender o candidato na sua essência.

Dizem até que é bom fazer uma ou outra pergunta meio fora dos padrões (mas totalmente intencional) pra ver como as pessoas reagem e, principalmente, o nível da resposta que elas dão. O ideal é sempre tentar deixar a pessoa à vontade, mesmo com as perguntas não convencionais. Creio que a chave pra conhecer um candidato também está nisso, pois se ele está à vontade, fala melhor e mais naturalmente, sem se preocupar em parecer o que não é. De certa forma, eu acho que tenho uma boa capacidade de captar isso. Já me enganei? Diversas vezes! Mas acertei bem mais do que errei, então acho posso dizer que meu "método" até que funciona.

Lembro de uma vez, há uns anos, em que entrevistei um rapaz que, à primeira vista, talvez não fosse um candidato à vaga. Ele era jovem, com uma experiência adequada à sua idade, cabeludo, com piercings e semblante acanhado. Estava na cara que ele era o que eu chamo de "Geek Metaleiro": um cara que, fora do trabalho, curte música pesada, tem muita energia, devora código e lê muito, especialmente coisas do tipo "Senhor dos Anéis", e adora Stanley Kubrick. Quem não conhece um? Mas aquele ali na minha frente parecia não ser ele. Pelas respostas e pelo currículo, dava pra ver que ele era bom tecnicamente e tinha maturidade maior do que a idade normalmente apresenta. Mas era extremamente introvertido. Talvez pudesse ser pelo fato de a entrevista ser em inglês. Mas algo me dizia que não era esse o problema. Daí eu comecei e recorrer ao meu MNO ("Método" Nada Ortodoxo) e comecei a falar sobre coisas que eu imaginava que ele gostava. Coisas de Nerd (ou Geek, whatever) mesmo. Não sei bem se sou um, mas convivo com muitos e acabo absorvendo e aprendendo muita coisa com eles. E não é que deu certo? A entrevista começou a fluir e, aos poucos, fui entendendo o cara e vendo como ele se comportava profissionalmente, como era em termos de organização, trabalho em equipe, etc.

A empresa o contratou? Não. Acharam que não se encaixava no que precisavam. Faz parte. Mas, como esse mundo é pequeno, ele participou de outro processo seletivo em outra empresa de TI onde tenho uma amiga que trabalha no RH. Ela me procurou, dizendo que ele havia mencionado ter conversado comigo e querendo mais informações sobre ele. Dei o meu parecer e ele acabou sendo contratado mais diante. Hoje ele trabalha numa subsidiária dessa empresa na Austrália, acreditem, como gerente de TI.

Nem tudo nessa vida deve ser tão amarrado a regras rígidas. A sensibilidade tem muito valor na percepção humana. Aprender a usá-la não é fácil. Em ciências exatas então, menos ainda. Mas é uma tarefa que os líderes modernos deveriam querer assumir. Até porque existem características e/ou competências que só são vistas quando você rompe algumas barreiras. Sem falar na diversidade cultural e conhecimento sobre as pessoas que você acaba absorvendo. Que tal começar a exercitar isso?


* Adaptação do texto escrito em 18/09/2008 



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