segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

A Lição do "Tiozinho" das Frutas

Lembram-se daquele comercial memorável da Mastercard (intitulado "Caipira" e que foi bastante premiado, por sinal) onde um cara apanha umas frutas de um pomar e um fazendeiro vem cobrar por elas? O sujeito então indica que não tem dinheiro, mas tem um cartão Mastercard. Quando ele pensa que vai conseguir levar as frutas de graça, o "tiozinho", supostamente dono do pomar, mostra pra ele uma máquina wireless de cartão de crédito, evitando que o "cliente" tivesse desculpas para não pagar pela mercadoria adquirida.

Essa cena já é uma realidade em muitos lugares, especialmente em pontos turísticos, pois facilita enormemente a vida de estrangeiros que querem comprar algo em outro país. É uma facilidade, sem dúvida. Você só precisa ter seu cartão de crédito em mãos para poder comprar praticamente qualquer coisa que o seu limite permita e só precisa aguardar uns dias para pagar as compras na sua fatura.


Mas não são todos os lugares que oferecem tal conveniência, infelizmente. Essa facilidade deveria ser, no mínimo, "de praxe" em qualquer cidade turística. No Brasil, porém, as coisas ainda estão demorando a acontecer. Temos um imenso potencial turístico, mas parece que ainda não estamos preparados totalmente para atender a essa demanda. Quando eu falo em "totalmente", refiro-me ao fato de observarmos diferentes comportamentos a respeito de uso da tecnologia para facilitar a vida dos turistas, de acordo com a região do país. Lembro agora de dois exemplos distintos que, de certa forma, me deixaram um pouco envergonhado em relação ao Rio Grande do Sul.

Há alguns anos, tivemos a visita de uns americanos na empresa onde eu trabalhava. Como iriam ficar por aqui durante quase um mês, resolvemos levá-los para conhecer um pouco do Rio Grande do Sul. Ora, qual lugar seria mais indicado e de fácil acesso do que a Região das Hortênsias na serra gaúcha (leia-se Gramado e Canela)? Foi o que fizemos. Levamo-los para dar uma volta e conhecer um pouco de um dos lugares mais legais de serem visitados em todo o Brasil. Começamos por Canela, para vermos as belezas naturais, e depois fomos para Gramado, onde a gastronomia e a "gastonomia" são melhores. Eis que os americanos simplesmente se apaixonaram pela cidade e queriam levar tudo o que
encontravam pela frente. E, como não falavam português, coube a nós servirmos de intérpretes e negociadores, pois eles sempre querem desconto em tudo.

Mas a euforia deles logo murchou, pois praticamente nenhuma das pequenas lojas de artesanato do centro de Gramado trabalhava com algum tipo de cartão. Parecia algo inconcebível, mas eles não conseguiram comprar nem metade do que queriam por causa disso. Rapidamente a paixão pela cidade transformou-se em indignação. - Onde já se viu uma cidade turística não aceitar cartão de crédito em nenhuma loja? - disse um deles. Era constrangedor, realmente. A falta de preparo da cidade para com esse tipo de situação ficara evidente naquele momento. E olha que andamos diversas quadras, com lojas uma ao lado da outra. Eram poucas as que aceitavam cartão. E, como sabemos como o americano é em relação ao consumo, obviamente eles não recomendariam (ou, pelo menos, não falariam bem) a cidade para outro americano que quisesse vir para cá.

Pouco tempo depois disso, eu viajei em férias para Pernambuco, onde conheci lugares maravilhosos e paradisíacos. Lugares remotos, distantes, mas de uma beleza natural impressionante. Num desses passeios, estive em Itamaracá, na ilha da Coroa do Avião. Um lugar lindo, num dia lindo, onde você realmente se sentia em férias e se emocionava só de olhar para os lados e ver toda aquela natureza exuberante. Ali, na ilha, havia uma série de quiosques e barzinhos, que atendiam os turistas com almoço, lanches e muita água de coco.  


Muitos bares são associados às agências de turismo, que ganham comissão se levarem turistas até lá. Obviamente, são os lugares mais caros. Eu, como já conheço esse esquema, resolvi caminhar um pouco e procurar algo mais em conta (fica a dica!). Eu estava de férias, é verdade, mas não queria ser explorado. Caminhamos um pouco e encontrei o "Bar do Beto". Era um lugar bem legal, com comida tão boa quanto os demais, mas com um preço mais acessível. Sem falar na simpatia dos atendentes. Após almoçarmos e tomarmos água de coco, o estúpido aqui lembrou que deixou o dinheiro no cofre do hotel. Mas eu tinha o cartão de crédito na carteira! Só que também lembrei que na ilha sequer parecia haver eletricidade. Quando eu estava pronto para recorrer à carteira da minha esposa, o atendente falou: - Se o senhor preferir, nós temos máquina de cartão de crédito sem fio. Bingo! Logo me lembrei do comercial mencionado no início deste post.

Consegui sair dali satisfeito com o lugar, com a comida, com o atendimento e com a consideração ao turista que eles demonstraram. Um lugar totalmente isolado e sem energia elétrica pôde fornecer um serviço que Gramado, uma cidade com padrão europeu (e, teoricamente, mais rica e com melhores condições de lidar com as taxas e comissões que as operadoras dessas máquinas cobram), não conseguiu. São essas discrepâncias que ainda fazem do Brasil um país que "engatinha" em termos de aproveitamento do potencial turístico. A tecnologia está aí pra facilitar esse tipo de serviço. Por que então não utilizá-la e aumentar as receitas e a arrecadação? Se o "tiozinho" das frutas consegue, todos os polos turísticos deveriam conseguir.



* Adaptação do texto publicado em 03/07/2008 

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