Pra nós, que trabalhamos na área de TI, ouvir falar em inovação é algo quase que corriqueiro. Não tem um dia que não se houve um gerente ou líder de equipe falar em inovação ou em ser inovador. É inovação pra cá, inovação pra lá... Essa gente que mexe com computador é meio obcecada por isso, não é verdade? Talvez até seja.
Porém, dá pra contar nos dedos aqueles que realmente entendem o que é inovação. Provavelmente a maior parte das pessoas confunde inovação com invenção. O problema, na verdade, é que muita gente "materializa" a inovação em forma de um produto, quando, na verdade, ela pode vir na forma de um processo melhor, na forma de um novo modelo de gestão, de um novo conceito de logística, etc. Enfim, há várias ramificações por onde a inovação pode caminhar.
O que parece não estar claro para muitos gerentes de TI é que a inovação diferencia-se da invenção por um motivo bem peculiar às empresas: geração de resultado. Isso mesmo. É pra isso que uma empresa existe, não é? O que caracteriza uma inovação é justamente a sua capacidade de transformar-se em resultado, ou, em outras palavras, dinheiro.
Aquele seu vizinho maluco que vive inventando coisas diferentes não é, necessariamente, um inovador. Ele o será se conseguir ganhar dinheiro com esses inventos. E ganhar dinheiro não significa simplesmente vender o invento. Nesse caso, ele seria apenas um inventor com skill de vendas!
As empresas inovadoras assim o são justamente pela sua capacidade de transformar ideias em geração de resultado. Quem não conhece os famosos casos a respeito da 3M, da Google, Apple, entre outras, de criações que viraram verdadeiras minas de ouro? Essas empresas produziram ideias que não só venderam, mas que criaram um mercado novo a partir delas, ditaram a forma de como todo o resto do mercado deveria se comportar. Algumas até influenciaram culturalmente gerações, mudando sua forma de trabalhar, de se comunicar e até mesmo de se relacionar. Isso é inovação.
Agora, vamos ao ponto. Será que você trabalha em uma empresa inovadora? O quão satisfeito profissionalmente você é por isso? Há diferenças em se trabalhar numa empresa dessas em relação às outras? As respostas para essas questões dependem da percepção de cada um de nós. Excluindo-se aquelas velhas histórias de empresas onde os funcionários jogam futebol durante o expediente, trabalham de bermuda com estampas coloridas todos os dias, têm dias da semana só para ficar em casa tendo ideias e fazem viagens a lugares bonitos com tudo pago apenas para buscarem inspiração, nem sempre as coisas são tão bonitas assim, principalmente no mercado de TI "real". Existem alguns casos como esses, claro, mas, normalmente as empresas da área não são tão "boazinhas" assim, pois trabalham sob uma perspectiva de estrutura enxuta e funcional. E não há nada de errado nisso.
Vamos analisar os casos fictícios (mas nem tanto) do Bruce e do Billy. Eles trabalham em duas grandes empresas multinacionais. A empresa onde o Bruce trabalha é uma gigante na produção de televisores de alta definição. São milhares e milhares deles por dia, sendo produzidos em fábricas de diversas partes do mundo. Na verdade, a empresa em si não fabrica nenhum componente das TVs. Ela apenas compra as partes de outros fornecedores e monta diferentes modelos para vender. O famoso OEM. A empresa tem um processo de produção, distribuição e logística que é considerado modelo e, portanto, inovador. Mas, para que tudo isso funcione, é preciso uma forte estrutura de TI. O Bruce trabalha nessa área. Ele é analista de sistemas e recebe um salário muito acima da média do mercado. Ele vive brigando com os gerentes, que parecem estar no século passado, com conceitos absurdos e com uma visão de processos completamente ultrapassada. Ele, que não é nenhum especialista em mercado, mas sabe como ninguém sobre o funcionamento da sua área, consegue ver os absurdos que são solicitados nos sistemas pelos gerentes de negócios e que ele, sem muita influência política, tem de encaminhar para o desenvolvimento. A empresa tem uma estrutura enorme, porém inchada, muito porque há bastante gente gerenciando e pouca gente fazendo. Em outras palavras, muito cacique para pouco índio. Além disso, ele enxerga que as cobranças, especialmente por prazos, parecem não ser tão fortes, pois sempre tem muito dinheiro para os projetos e, se algum problema ocorre, aparentemente é algo simples de se contornar, ao menos financeiramente. Isso tudo o frustra de certa forma, pois sabe que muito mais poderia ser feito com os recursos financeiros de que a empresa dispõe.
Já o Billy trabalha, também como analista de sistemas, em uma empresa concorrente da empresa em que o Bruce atua. A diferença é que essa empresa desenvolve e fabrica seus principais televisores, terceirizando uma ou outra produção de menor escala. Esse tipo de escolha de atuação de mercado faz com que a essa empresa tenha a obrigação de possuir uma área de Pesquisa e Desenvolvimento, aquela mesma área que a gente tende a achar que é a "salvação da pátria" das empresas, a responsável por gerar as ideias geniais, que se transformam nos produtos que o Michael Porter chama de "Estrelas", que já nascem dando altos lucros. Da área de P&D já saíram muitos produtos que se tornaram sucesso de vendas. Nessa empresa, inovar é algo que está intrínseco na cultura organizacional, todo mundo é estimulado a ter ideias. Billy convive com pessoas de pensamento muito mais aberto, visões mais modernas de mercado e que parecem respirar inovação. Seu salário não é tão alto quanto o de Bruce, mas é considerado compatível com o mercado. Mesmo com uma grande market share, a empresa cobra muito os seus colaboradores, que têm metas de desempenho claras a serem cumpridas. Monotonia é algo que não se vê nessa empresa e as metas atingidas são recompensadas com prêmios que estão de acordo com o que foi conseguido.
Temos aqui dois exemplos diferentes de inovação, No primeiro, a inovação está nos processos de produção e logística, e aparentemente não se reflete no restante da empresa, que parece comportar-se como a maioria das autarquias em termos de atitude. No segundo caso, a inovação está nos produtos, em como fazer TVs melhores. E essa cultura é passada para as outras áreas.
A moral da história é simples: dependendo do seu perfil, um ou outro trabalho pode ser o mais adequado pra você. Pessoas que gostam de ter ideias e sempre estão buscando o novo poderiam incomodar-se, caso estivessem no lugar do Bruce. Do mesmo modo, pessoas extremamente racionais e binárias provavelmente não se encaixariam no emprego do Billy.
Mas acreditem, parecer inovador e ser inovador são duas coisas bem diferentes. E trabalhar em um lugar realmente inovador também é bem diferente do que trabalhar em um lugar onde existe a "inovação de fachada". Podemos optar em ganhar mais e estamos sujeitos a coisas com as quais não concordamos, ou ganhar um pouco menos e trabalhar com mais estímulo e qualidade de vida. Pense nisso quando estiver fazendo sua próxima entrevista de trabalho. Você gostaria de ser o Bruce ou o Billy?
* Adaptação do texto publicado originalmente em 21/11/2007
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